Segue em cartaz no CCSP (Centro Cultural São Paulo) a exposição “A(u)tos: A(u)to1 – Contra Cogente” que extrapola os pisos expositivos para levar obras e performances para espaços pouco usuais do CCSP, propondo a surpresa do público e sua interação direta com as narrativas e obras dissidentes das obras curadas.
Numa ocupação coletiva, quatro artistas participam da programação: abigail Campos Leal, com a performance “nosso apetite se trama num outro tom”; Yhuri Cruz, com “Negrociação #2”; Diego Crux apresenta as produções “Because i’m a black man”, “Desde quando você sou negrx” e “Tudo fica blue”; e Flávio Cerqueira expõe a escultura “Onde tudo acaba em mim”.
O nome da exposição aproxima o universo cotidiano de jargões jurídicos. A primeira palavra, autos, define um documento, uma reunião formalizada de materiais, tornados legais, do que virá a ser evidências colhidas como ferramenta para a criação de contextos de encaminhamento investigativo – prerrogativa incontornável do estado de visibilidade.
A segunda palavra, atos, pode deter atenção por significações distintas. Neste projeto, em especial, considerada como movimento sem necessariamente fim ordenado ou planejado, ato como prática, gesto, manifestação de qualquer natureza, ímpeto ou ação direta.
A articulação destas duas palavras, de sonoridade parecida e significado completamente distinto, determina o escopo conceitual do projeto. A curadoria atenta-se, em contraste, com as operações mais radicais e profundas das implicações dos termos.
“Com apenas um ato é possível criar ativações e interrupções que interferem em toda uma cadeia produtiva. Um auto, por sua vez, é parte fundamental da produção de narrativas dentro dos processos de fabricação da justiça; os autos sinonimamente são aparelhos operacionais e produtivos do fazer justiça”, explica o curador Victor Hugo.
A palavra cogente, também do universo jurídico, se refere a ordens que não podem ser alteradas, sendo obrigatória a sua realização. Desta forma, a exposição A(U)TOS surge como uma resposta ambígua e contrária às normas cogentes, com a apresentação de imaginários divergentes.
abigail Campos Leal, performance “nosso apetite se trama num outro tom”
Local: Piso Flávio de Carvalho
A performance realizada por abigail implica no estabelecimento de trocas compartilhadas e comprometidas entre artista e público. A performance disponibiliza um alimento ancestral da performer – o acará – em troca de uma proposição sonora do público. Cultura alimentar, trocas coletivas, cacofonia, experimentações sonoras e radicais são temas mobilizados pelo trabalho. O resquício da performance é a própria sonoridade formulada no processo.
Flávio Cerqueira, escultura “Onde Tudo Acaba Em Mim”
Local: Jardim Suspenso – Lado 23 de Maio
“Onde tudo acaba em mim” é uma escultura que apresenta um pequeno garoto negro, apenas de bermuda e chinelo de tipo slide, acompanhado de dois objetos em punho: uma lanterna e uma bússola, equipamentos de auxílio para reconhecimento e busca. Um X em tinta branca contrasta com o bronze nas costas do personagem, sendo essa área do corpo impossível de ser alcançada a partir da visão. Entre localização, mistério e uma procura que está anunciada em seu próprio corpo, o trabalho visibiliza um movimento infinito concentrado no personagem esculpido.
Yhuri Cruz, performance “Negrociação #2”
Local: Sala Jardel Filho
“Negrociação #2” é uma performance oriunda de uma grande pesquisa do artista em continuidade e intitulada “Pretofagia”, sendo a performance apresentada uma ação direta de troca, na qual o público terá a oportunidade de ceder espontaneamente registros seus em vídeo e áudio, a partir de suas línguas e vozes, em troca da camiseta “Anastácia Livre”, oferecida pelo artista aos participantes do ato.
Diego Crux, obra “Desde quando você sou negrx”
Local: Biblioteca Sérgio Milliet
A obra consiste numa faixa que apresenta elementos centrais de sua pesquisa: a questão de cor, a palavra escrita e a ráfia – material apropriado na construção da faixa e de uso comum para transporte de grãos e comunicação visual de propagandas de rua não-formais. A frase “Desde que sou negrx” introduz ao público a disputa pelo reconhecimento de uma multiplicidade de existências e experiências, revisitando e incidindo sobre o que são as diferenças e seus propósitos.
Diego Crux, obra “Because I’m a black man”
Local: Jardim Suspenso
A obra é uma placa giratória que disputa em caráter direto e simbólico a noção de vitória e derrota em movimento contínuo no espaço. Esse trabalho é um desdobramento de outra formulação artística “Tudo fica blue” que também tem como elemento disparador as duas músicas do músico jamaicano Alton Ellis, Black Man’s World e Black Man’s Pride.
Diego Crux, obra Tudo fica blue
Local: Piso Flávio de Carvalho
A obra é um site que pode ser acessado dentro e fora do espaço expositivo. Diante do volume de imagens e sonoridades, o público participa deslocando esses itens no portal. A obra possui noções de vitória e derrota implicadas em sua produção, visto que a narrativa e disposição no site é compartilhada com o público. O conflito e corresponsabilidade pelo rearranjo está dada no ato de fruição da obra, em diálogo com o que é público, relacional, político e cultural em trabalhos de arte e pré-selecionado pelo artista.
Serviço
A(u)tos: A(u)to1 – Contra Cogente
Temporada: até 20 de agosto
Onde: Piso Flávio de Carvalho, Jardim Suspenso, Praça das Bibliotecas e Sala Jardel Filho | Rua Vergueiro, 1000 – Paraíso, São Paulo/SP
Classificação indicativa: livre
Grátis